quarta-feira, 17 de março de 2010
Sapatos
As boates encostadas umas às outras. Do outro lado da rua enfileiram-se barzinhos, também lado a lado, onde se faz o “aquecimento”. Aquela cerveja especial - em geral cerveja, mas também pode ser vodca, tequila ou algo que o valha. Até altas horas, enquanto as boates não lotam, é nos bares que se bebe. Da mesa em que está com as amigas ela avista o namorado.
Choque!
Não, não saíram pra farra escondido como tantos outros casais naquela noite hão de ter feito. Ela se esforça, dá um sorriso amarelo e sugere que juntem as mesas. A cada dose, a tensão parece diminuir. Os amigos dele chegam até quase a parecer entrosados com os dela. E eles, inicialmente apreensivos, já roçam as pernas por debaixo da mesa.
Onze horas, meia-noite, dançar é a pedida. As boates agora já cheias. Luzes que piscam parecendo deixar a cabeça ainda mais zonza. Sim, devem ser as luzes apenas. O casal agora dança bem junto de maneira sensual. Ela ri solto, fazendo leves brincadeiras com a turma toda. Tudo é festa.
O sol já ensaia os primeiros raios e todos já se dispersaram. Ficou o casal que agora discute na calçada. “Vá à merda, seu puto”, ela grita. “Puta é você que até pros meus amigos dá bola quando bebe”, revida. Pronto, era a deixa que ela havia esperado.
- Eu disse que hoje era dia de me divertir SOZINHA. Mas o que você fez? Correu para o bar que sabe que eu gosto com seus amiguinhos, fingindo uma forçada “coincidência”. Cala a boca! Você sabe que é lá que eu vou sim, onde a cerveja é mais gelada e o rapaz da música ao vivo quando canta música romântica, sempre olha pra mim. É isso: você não suporta ameaças ao seu “terreno”, ao seu “domínio”.
- Nada disso!
- Claro que sim, mera demarcação de território. Até mesmo porque eu vi o jeito que você olhava para esse seu “amigo” inseparável...
E caindo em prantos, atirou-lhe na cara os sapatos que, cansada, trazia à mão.
Pausa. Que devaneio é esse, Mara Beatriz? Talvez a história daqueles sapatos atirados ao chão seja outra. Caídos de uma sacola a caminho do sapateiro. Ou simplesmente jogados por alguém que não mais os queria e não teve a cidadania de devidamente colocá-los no lixo. Certo que é segunda-feira de manhã e, enquanto você vai para o trabalho as ruas ainda recendem à farra alheia, mas deixar-se divagar assim já é demais. Ou será que é você que anda meio perdida como aqueles sapatos? Ou quem sabe esses calçados apenas te fizeram relembrar o quanto, no terreno do amor, mesmo os maiores dramalhões, as histórias mais patéticas, ainda assim podem ser belas... Quem saberá?
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